- Desempregada e aluna de pós-doutorado, a Virologista
janaubense vendeu produtos de beleza para complementar renda
- Casal cientista: A Virologista Angélica Campos é casada
com o também Virologista Luís Carlos Bentim Góes
Foto arquivo pessoal
A janaubense Angélica Cristine
Góes de Almeida Campos e o esposo Luiz Gustavo Bentim Góes: Ciência em casa.
**Reportagem do “Fantástico”,
TV Globo
SÃO PAULO - A experiência dos 20 anos
dedicados à ciência é a aposta da aluna de pós-doutorado Angélica Campos na
luta contra o coronavírus, no Brasil. Aos 42 anos, a virologista que é
voluntária na plataforma científica Pasteur-USP chegou a vender produtos de
beleza para complementar a renda durante o mestrado e doutorado.
A força-tarefa a qual a
cientista e outras centenas de profissionais fazem parte pelo país teve a
situação mostrada pelo Fantástico. Na maioria deles, os pesquisadores
resolveram trabalhar para ajudar do diagnóstico da Covid-19 sem receber salário.
Nascida em Janaúba (MG),
o caminho de Angélica para conseguir a qualificação foi longo e começou aos 10
anos, quando acompanhava o pai no trabalho de balconista em uma farmácia.
“Meu pai ficava me
ensinando algumas coisas sobre medicamentos. Eu achava muito bonito os
desenhos, as bulas dos medicamentos com as fórmulas químicas, isso me seduzia
muito. E com isso eu fui cada vez mais me aproximando das áreas biológicas”,
lembra.
Foto arquivo pessoal
Angélica Campos com seus pais Marlene e Adilson Campos.
Com o foco em trabalhar
com saúde, a mineira estudou em escola pública, passou no vestibular e revezou
as aulas na faculdade com o trabalho até se forma em biologia.
“Quando eu vim da minha
cidade para cá (São Paulo), eu abandonei o emprego e vim com todas as minhas
economias. Tive que procurar formas alternativas de me sustentar. Trabalhei nos
finais de semana, eu vendi produtos de beleza, eu combinava com as minhas
amigas de passar os aventais delas. Eu precisava comer, eu precisava sobreviver
e eu precisava fazer ciência. Eu acreditava nisso.”
Durante o meu mestrado,
enquanto não tinha bolsa, a cientista foi professora do estado. A
‘oportunidade, na época, era “uma via de mão dupla”.
“Acreditava que era uma
forma de eu devolver à sociedade toda a minha formação de escola pública,
ensinando um pouco do que eu sabia para os meus alunos, e também eu precisava
me manter. Alguém precisava pagar as contas”, diz.
Ciência em casa
Em 2007, ela conheceu o
marido, Luiz Gustavo Bentim Góes, também cientista. Na ocasião, a estudante
fazia o primeiro ano do doutorado com o vírus da raiva em morcegos e ele a
seleção para o doutorado dele, com coronavírus.
“Nos aproximamos e não
nos desgrudamos mais, começamos a trabalhar juntos. Ele me ajudou na minha tese
e eu na dele. Nossos trabalhos foram sempre em parceria. Estudos de viroses
emergentes em populações de humanos e animais silvestres.”
Da união do casal de
cientistas nasceu a Maria Laura, hoje com 4 anos.
“É engraçado porque a
gente acorda pensando em ciência, a gente almoça pensando em ciência e a gente
vai dormir pensando em ciência. É uma dedicação muito grande. A gente precisa
ler muito, precisa estar sempre estudando, precisa estar disponível, precisa
estar pronto para situações, mas a gente tem uma criança em casa. Então, ela
precisa também de atenção do pai da mãe.”
Atualmente, a renda da família
é mantida com a bolsa de pós-doutorado do CNPq do marido, mas deve mudar nos
próximos dias. A diretora da Plataforma Pasteur/USP, Paola Minoprio, conseguiu
uma bolsa temporária para Angélica no laboratório e na força-tarefa contra o
coronavírus.
"Não podíamos perder
a especialidade da Angélica nesse exato momento. Então, nós fomos pedir
dinheiro com recurso do Instituto Pasteur de Paris, que ela vai ser paga nos
próximos dias”, contou Paola ao Fantástico.
“Se não aparecesse essa
bolsa, para continuar ajudando aqui na força-tarefa, eu ia ter que voltar a
vender os meus produtos de beleza, que seria meio complicado nessa situação de
quarentena, voltar a lecionar à distância, ou buscar alternativas até chegar no
limite. Se chegar um momento que eu não tenho bolsa e meu marido não tem bolsa,
um de nós teria que abrir mão da ciência em detrimento de sustentar a família”,
afirmou Angélica.
Pesquisadores brasileiros
Na Universidade Federal
do Rio de Janeiro, a análise das amostras se concentra em um laboratório
geralmente usado para pesquisa sobre HIV e dengue. Uma parte dos testes com
pessoas que apresentam sintomas da doença é coletada ao prédio ao lado, mas a
maioria chega à equipe de 15 hospitais do estado. Ao todo, são verificadas
cerca de 300 por dia e em média 10% são positivos para coronavírus.
Em um laboratório da
UFRJ, a maioria era de estudantes de doutorado. Os alunos sobrevivem com uma
bolsa de pesquisa de R$ 2.200 em dedicação exclusiva.
Em nota, o Ministério da
Justiça não soube dizer quantas unidades de educação participam da força-tarefa
no Brasil. Um levantamento do Fantástico com secretarias de saúde apontou até o
domingo (5) nove instituições em sete estados e outras 19 que se preparavam
para o trabalho.
Desde 2014 o CNPQ, a
principal agência do país em fomento a pesquisa, cortou mais de 25 mil bolsas.
O investimento caiu de R$ 2,5 bilhões, em 2014, para pouco mais de R$ 1,1
bilhão em 2019.
A UFRJ afirma que o
Ministério da Educação vai liberar créditos extraordinários de R$ 64 milhões
para instituição considerando a necessidade do enfrentamento da pandemia.
Na semana passada, o
Ministério Público Federal Pediu à Justiça a suspensão de uma portaria da
Capes, ligada ao Ministério da Educação. Segundo o MPF, a portaria 34, que foi
publicada no dia 18 de março, alterou processos seletivos que estavam em
andamento e “concretizou o cancelamento de concessão de bolsas de mestrado e
doutorado”.
O Ministério da Saúde e o
Ministério da Ciência e Tecnologia anunciaram um pacote conjunto de R$ 50
milhões para financiar pesquisas sobre o coronavírus. Segundo o ministro Marcos
Pontes, o dinheiro está liberado.
“Tanto para o CNPQ quanto
para quanto para Finep, na segunda-feira inicia a chamada pública e assim que
os projetos forem analisados o dinheiro já está disponível”, destacou o
ministro Marcos Pontes ao Fantástico.
https://g1.globo.com/fantastico/noticia/2020/04/07/virologista-que-luta-contra-o-coronavirus-vendeu-produtos-de-beleza-para-complementar-renda.ghtml?utm_source=facebook&utm_medium=social&utm_campaign=fant&utm_content=post
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