JANAÚBA
(por Daniel de Paula*) – Tem um monte de ditado que se encaixa no que eu
escrevo hoje. Mas, talvez, o que mais traduza seja aquela do “quanto mais
difícil a batalha, maior a vitória”. É assim que volto de mais uma semana no
Norte de Minas Gerais com a bateria recarregada, inspirado para seguir o ano
firme da pecuária brasileira. Com a admiração renovada em um povo que não tem
medo das intempéries. Respeita, mas não teme. Uma região onde, em alguns
cantos, a chuva do ano todinho não encheu sequer um copo d’água, mesmo assim
apresentou na 34ª ExpôJanaúba a sua força de produção em pecuária e frutas.
Algo que serve de exemplo para o Brasil e para o mundo.
Foto Daniel de Paula
Bezerros
de ano vendidos em leilão em Janaúba semana passada: valor chegou a R$ 205,00 a
arroba.
A
crise hídrica no Brasil é uma realidade assustadora para quem nunca se preparou
para ela. Vide o Sistema Cantareira, a disputa Rio x São Paulo por alguns goles
d’água do Paraíba, reservatórios secos e população sem água em grandes regiões
metropolitanas, onde continua algum racionamento. Mas eles têm perspectivas de
normalização do clima minimizar esse drama.
No
Norte de Minas, é a pior estiagem dos últimos 80 anos. Até os californianos
estão dando uma espiada para Janaúba e região, para aprender a conviver com a
falta de chuva e, mesmo assim, produzir o que se vê por lá.
A
Califórnia está também vivendo a pior seca em 120 anos de medições
meteorológicas. Estado mais populoso dos Estados Unidos (38 milhões) e que
produz um terço dos vegetais de todo o país (dois terços das frutas e nozes),
de imediato corta 25% do consumo da água em todos os setores.
Foto
Oliveira Júnior
Jornalista Daniel de Paula na 34ª ExpôJanaúba.
A
chuva cai, preferencialmente, no Norte, acima de Sacramento. Desce para o Sul,
onde há mais gente, pelos canais de distribuição e dutos que formam o Central
Valley ou outros meios construídos na década de 1930 (!). O problema é que não
chove e a perspectiva lá é ruim, tanto quanto a do Norte de Minas.
Desde
a virada do século passado, os americanos já se preparavam para períodos secos,
mas esse é histórico e a distribuição começa a ficar comprometida, apesar de
todo o comprometimento do governo em dar soluções ao problema, para não causar
um colapso em todo o ocidente.
Uma
das soluções – dessalinização da água do mar – está ainda descartada por custar
mais de US$ 1 bilhão e resolver muito pouco (apenas 7% de incremento na água
utilizável). Isso gera uma estimativa de prejuízo superior aos US$ 5,7 bilhões
à economia agrícola americana.
O
processo de dessalinização já existe em Israel e funciona. Tanto quanto o de
reuso (reciclagem) da água, que os mineiros copiaram rapidamente para
reaproveitar as aspersões moderadas nos rodízios de irrigação, o que não deixa
desperdiçar uma gota da escassa água mineira.
Foto Paulo &
Galego
Jornalista Daniel de Paula
com Neurisvan Teixeira dos Santos, da Colonial Agropecuária, na 34ª ExpôJanaúba.
Se
os californianos visitarem Janaúba e alguns dos 84 municípios que compõem a
Aspronorte (Associação dos Sindicatos Rurais do Norte de Minas e Vale do
Jequitinhonha), às vezes conseguem driblar essa catástrofe hídrica, como os
mineiros sempre conseguiram para se tornarem grandes produtores de frutas de
muita qualidade. Banana prata, caju, limão, manga e mamão, só para citar
algumas frutas gorutubanas produzidas na região do rio São Francisco, em
diversos projetos, continuam exportadas e bem valorizadas em todos os mercados
nacionais e internacionais.
Isso,
mesmo tendo chovido ali apenas 470 mm de abril do ano passado até o final de
maio – dos quais 100 mm só nos últimos 50 dias. Você deve se perguntar como é
que se produz fruta, carne e leite, se não choveu um copo d’água daqueles de
cinema por ali? Uma parte da resposta está em estratégias e bom uso da água dos
mananciais, como Barragem do Bico da Pedra, Rio Gorutuba, o Velho Chico.
É
óbvio que esses números não fazem ninguém ali em Janaúba acordar todos os dias
agradecendo o céu por não chover. O que eles agradecem é o sol que potencializa
a produção de melhores frutas e o solo fértil, que se torna mãe gentil até de
pastagens, que viram feno em pé.
Com
a tecnologia empregada na formação dos pastos, mesmo sem irrigação fornecem
nutrição adequada para produção de carne a campo com a eficiência traduzida em
números, como bezerros produzidos a partir dali e negociados em leilões da
exposição por valores equivalentes até a R$ 205,00/@.
Foto Oliveira Júnior
Jornalista
Daniel de Paula e equipe da TV Canal do Boi na 34ª ExpôJanaúba sendo observados
por alunos atendidos pelo projeto Criança no Parque, idealizado pelo Sindicato
Rural de Janaúba.
Imaginem
se chovesse!? Enquanto a água do céu não vem, é das reuniões com autoridades
federais, estaduais e municipais que lideranças como a de José Aparecido
Mendes, presidente da Aspronorte e do Sindicato Rural de Janaúba, com todas as
suas diretorias, que chega o alívio para desafogar os produtores.
Ainda
mais os pequenos, que detém entre 1 e 50 hectares de terra e que representam
89% da força produtiva da região. Alívios como renegociação de dívidas,
desburocratização na permissão para perfurar poços artesianos – para posterior
licenciamento – e outras modalidades de socorro que vêm da sensibilidade dos
governos. Aí, o produtor do Norte de Minas acorda todo dia não agradecendo a
seca, mas sim a força de continuar trabalhando para se tornar um exemplo para o
mundo.
*
Quando citei estratégias aí acima para driblar o problema da seca e não faltar
comida para o gado, lembro do papo que tive com o amigo Neurisvan Teixeira dos
Santos, diretor da Colonial Agropecuária. Ele disse que uma das saídas para não
faltar comida e ainda assim manter o nível de produtividade do seu Nelore é
abater 1.500 matrizes, para equilibrar o rebanho e ainda fazer dinheiro com a
firmeza da arroba paga pelo frigorífico reaberto recentemente em Janaúba – a
antiga planta do Kaiowa, que virou Independência e que virou, depois de cinco
anos fechado, o Minerva, que abate hoje até 400 cabeças/dia.
Foto Paulo &
Galego
Jornalista
Daniel de Paula com Ailton Santos de Souza, da Confboi, na 34ª ExpôJanaúba 2015.
*
Falando em Colonial e em estratégia, a raça criada na propriedade de Gabriel
Donato de Andrade, em Janaúba, já é uma realidade. Desde a década de 1970, ele
e suas equipes já vinha mesclando seu melhor Nelore identificado como leiteiro
com o seu Gir da Calciolândia, que fica em Arcos/MG (660 km de distância).
Estudando os resultados de todos os testes feitos em parcerias com entidades
como Embrapa Gado de Leite, Emater, Epamig e Abcz, encontrou no NeloGir que ele
desenvolveu um cruzamento perfeito com Holandês provado, que resultou na
Zebulanda, reconhecida pelo Ministério da Agricultura e registrada pela Abcz.
Na exposição de Janaúba, foram vendidas 835 bezerras de sete meses de média de
idade a R$ 2.200,00 cada. Valorização que vem, primeiro, porque poderão manter
a produção média de 12 kg/dia de leite exclusivamente a pasto, segundo porque
estão aptas a receber sangue de holandês de novo ou Gir, dependendo da necessidade
do comprador, e ainda produzir os machos que serão os novilhos precoces que
podem ser vendidos, também, com valor agregado, gerando ganho rápido e seguro.
Outra grande prestação de serviços para a pecuária que vem do Norte de Minas.
(*Daniel de Paula é publicitário e jornalista desde 1989. Trabalhou em
impressos, rádios e televisão a partir de São Paulo, onde foi criado e onde se
formou, com destaque para oito anos como comentarista dos canais Sportv/TV
Globo até 2004. Hoje é repórter do Canal do Boi, canal integrante do SBA
(Sistema Brasileiro do Agronegócio).
Link
dessa notícia: http://ruralcentro.uol.com.br/analises/um-golias-chamado-norte-de-mg-4967#y=421
Comentários